Search
Close this search box.

Sandra Abreu

Torcicolo

Uma dor danada nas costas que já vinha desde sei lá quando, mas é aquilo né, o dia-dia faz a gente se acostumar a tudo. Até que não teve jeito, o pescoço travou mesmo. Não podia dizer nem que sim nem que não, a cabeça dura no tronco. Passei cânfora, alonguei, nada. Já era falta de respeito tratar o corpo assim. Pedi folga na empresa, marquei a massoterapeuta amiga da Leila da academia, ela falou que a bicha era porreta. Falava enrolado e tudo, tinha vindo lá dos lados dos Andes.  Eu acho.  No local marcado estava eu lá. Numa casa antiga, nos fundos de um terreno sem muro. Ela, uma senhorinha dessas fortes, parrudona, me deu uma ficha com um desenho de corpo inteiro cheirando a álcool, papel de mimiógrafo morno. Me senti na quinta série esperando a tia cuidar de machucado do recreio.  Marquei no papel onde doía, risquei quase o desenho todo. Tirei a blusa, fez frio e constrangimento no peito. Sentei na maca, ele me analisou e estalou a lingua entre os dentes com cara de coisa grave. Coçou a cabeça e perguntou, o que mais eu sentia além das costas. Queria saber o que eu não tinha marcado no papel. Comecei a lista que era grande: dor de cabeça, diarréia, pesadelo, raiva, desesperança, mal hálito, cecê, preguiça, falta de sorte, inveja e fome. Mas fome de doce, sabe? Por que comida eu não tava querendo não. Com a mão na cintura ela avaliou um pouco e já tinha o diagnóstico. —É. Entendi. Tá com encosto, — a certeza era preocupante — um encostinho nojento. Vamos tirar ele daí![ TEXTO COMPLETO SERÁ PUBLICADO EM BREVE NO PRÓXIMO LIVRO]